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Ante ao caos vivido atualmente em todo globo em razão da declarada pandemia do vírus COVID-19, vemos os Poderes Executivo e Legislativo tomando diversas medidas drásticas em todos os entes de federação em um esforço para conter os avanços do contágio da doença. Ocorre que, ainda que sejam necessárias, algumas delas romperam com o pacto federativo, bem como a repartição dos poderes, constante em nossa Carta Magna de 1988, mais precisamente em seus artigos 22, 24, 25, parágrafo único e artigo 30. Já antecipo que minha intenção com esse texto não é criticar ações de governantes, mas sim promover a discussão acadêmica e a disseminação de informações acerca do nosso ordenamento. 

Fazendo um breve introito: Pela interpretação do artigo 1º de nossa Constituição, o Brasil é uma federação, composta pela união indissolúvel dos Estados, Municípios e Distrito Federal, todos eles possuindo autonomia sobre determinados assuntos. Visando a organização entre esses entes, foi criado o sistema de repartição de competências, estipulando limites sobre o que cada ente pode tratar em sua atividade legiferante. Dessa forma, um ente não deve adentrar na zona de competência do outro, mantendo assim o pacto federativo. Um adendo: por mais que muitos pensem que a União tem poder sobre os demais, saiba que não há hierarquia entre eles, apenas essa divisão que citei anteriormente. 

Nessa repartição, foram determinadas as competências da União de forma expressa, assim como as dos municípios, que tratam de assuntos de interesse local. Aos estados restaram as competências que não foram destinadas aos demais, sendo chamada então de Competência Residual.

Voltando ao tema principal, no que tange aos estados, houveram governos que tiveram como algumas de suas determinações a proibição da entrada de ônibus interestaduais e de voos, nacionais ou internacionais, em seu território quando advindos de locais onde a circulação do vírus foi confirmada ou a situação de emergência foi decretada. Houve também a limitação da circulação de ônibus intermunicipais em determinadas áreas sob o mesmo fundamento.

Diante disso, podemos notar que, no tocante às restrições interestaduais e aéreas, os chefes do Poderes Executivos Estaduais extrapolaram sua competência ao tratar de temas afetos à União, conforme previsto no artigo 22, inciso XI da Constituição Federal. O transporte interestadual é de competência privativa federal e por isso não poderia estar presente no referido decreto. Por outro lado, em relação ao transporte intermunicipal, em razão da sua competência residual prevista no artigo 25, parágrafo único, há o entendimento de que o tema poderia ser tratado pelos estados-membros, inclusive havendo um parecer favorável à tese do ex-Procurador Geral da República, Rodrigo Gurgel, na Ação Direta de Inconstitucionalidade 4289 proposta pela Confederação Nacional do Transporte.

Já no âmbito municipal, vemos prefeituras limitando o horário de funcionamento dos estabelecimentos comerciais com o intuito de reduzir a aglomeração de pessoas nas ruas. O artigo 30 da Lei Maior, em seu inciso I, prevê a competência municipal para legislar sobre assuntos de interesse local. Resta a questão: o horário de funcionamento dos estabelecimentos é de interesse local? Em razão disso, o Supremo Tribunal Federal firmou o entendimento em sua Súmula Vinculante 38, convertida da Súmula 645: “É competente o Município para fixar o horário de funcionamento de estabelecimento comercial.” 

Há, todavia, uma pequena exceção. Estabelecimentos bancários não são assuntos de interesse local, não cabendo aos municípios legislar sobre eles. E a quem caberia? Segundo a Súmula 19 do Superior Tribunal de Justiça, à União: “a fixação do horário bancário, para atendimento ao público, é da competência da União.” O entendimento foi no sentido de que está em jogo o sistema financeiro nacional, portanto, o interesse é geral e a competência é federal.

Mas e o que foi contrário à Constituição? Não surtirá efeito? Não é bem assim. Para que elas deixem de surtir efeito na sociedade, a constitucionalidade dessas normas teria que ser questionada perante o Poder Judiciário, que decidiria por sua compatibilidade ou não com a Constituição. Vale lembrar que todas as leis criadas em nosso país devem estar de acordo com a Constituição, sob pena de inconstitucionalidade e sua consequente invalidação, uma vez que ela se encontra no topo de todo o ordenamento jurídico brasileiro. Entretanto, o que deve ocorrer é uma ratificação dessas medidas pelo Governo Federal através de um Decreto presidencial, já que são normas de suma importância para o combate ao Coronavírus. 

Pudemos observar que, em nosso atual momento, muitas medidas de proteção tiveram que ser tomadas e outras tantas surgirão. Buscando a proteção de seus administrados, o Poder Público findou até mesmo em ferir a repartição constitucional de competências. Não obstante, sem romper com quaisquer dispositivos da Carta Magna, pelo contrário, em consonância com os artigos 1º, III (Princípio da Dignidade da Pessoa Humana), artigo 5º (Inviolabilidade do direito à vida), artigo 6º (Direito à saúde) e tantos outros, nós podemos fazer nossa parte. Fiquemos em nossas residências e tomemos os devidos cuidados para que nossa nação se veja livre desse mal que tanto nos assola nos últimos dias.

Texto escrito pelo Dr. Eros Silvestre Ávila, Advogado inscrita na OAB/RJ. 

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3 comentários:

  1. Parabéns, Eros!
    Eu,como leiga, achei seu texto bastante compreensível e me fez ter um olhar mais técnico em relação à esta situação que estamos vivendo.

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  2. Parabens Dr.Eros eu e sua mae estamos orgulhosos por vc.Que DEUS lhe abencoe.

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  3. Parabéns, Dr. Eros excelente texto!
    Deus ilumine seus caminhos e de sua família.

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